quinta-feira, 17 de setembro de 2009

De tudo que sei


De tudo que amei. De tudo que represei. De tudo que calei. De tudo que gritei. De tudo que desejei. De tudo que abortei. De tudo que acreditei. De tudo que questionei. De tudo que quis. De tudo que fiz. De tudo que dei. De tudo que me foi roubado. De tudo que comprei sem ter experimentado. De tudo que não gostei sem sequer ter provado. De todas minhas dúvidas e certezas. De todos os meus não-saberes. De todos os meus medos ocultados. De todas minhas feridas rasgadas. De todas minhas cicatrizes que o seu olho não vê. De toda parte de mim que ainda não me foi revelada. De tudo que há por fora e por dentro. De tudo que em mim é movimento. De tudo que não vai nunca a lugar algum. De tudo que julguei ser verdade e era mentira. De todas as vezes que me enganei. De todas as vezes que falei por não saber dizer. De cada momento que calei para você poder me ouvir. De todas as coisas que não sei e jamais saberei. De tudo que penso saber e, na verdade, não sei. De todas as dúvidas que virarão certezas. De todas as certezas que se transformarão em poeira. De toda dor que, um dia, será alegria. De toda alegria que se findará em pranto. De tudo que não cabe num papel. De tudo que caneta não sabe escrever. De tudo que os livros não explicam. De tudo que não possui lógica. De tudo que em seu maior paradoxo é coerente. De tudo que todas as palavras jamais poderão transcrever. De tudo isso e mais um tanto. De muito, pouco, raso, fundo, frio, quente, azul e nublado. De todas as cores, de todos os tons, de todos os sons. Da música e do silêncio. Do divino que há no humano e do humano que há no divino. Sou o que o ontem fez de mim. Sou o que sou hoje. Amanhã, sou folha em branco.

Carolina Braga
[ hoje ]

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Eu quero mais!


Sabe quando você pára, pensa e não consegue encontrar sentido? Quando você se pergunta para onde mesmo estava seguindo, se caminhando sozinha você não poderia chegar onde queria. A idéia era uma caminhada a dois e não uma jornada dupla. Acho que você se confundiu. Eu já tenho meus fardos, meus pesares, meus traumas, continuar te carregando com todos os teus adendos seria pesado demais pra mim. E acredite apesar da pouca idade minha coluna já se encontra significativamente declinada. E não é por displicência de minha parte, é só a velha mania de bancar a heroína – de meus terrores e do resto do mundo. Acontece que agora eu dei pra experimentar o doce sabor de minhas imperfeições e limitações. Doce? Pois é. Me sentir e me aceitar mais humana tem me proporcionado um sabor novo em tudo, mais leve, mais interessante até. Sim. E eu quero mais!

Carolina Braga

[ agora ]

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

A clitorectomia, eu e você


Você já ouviu falar em clitorectomia? Trata-se de uma prática arcaica e desumana praticada há vários séculos em comunidades tribais africanas e que encontrou apoio, melhor dizendo, cumplicidade na religião do profeta Maomé, ou seja, o Islamismo. Infelizmente, tendo em vista que essa é uma religião que possui adeptos nos cinco continentes, essa prática absurda há muito é realizada no mundo em que eu e você vivemos, o chamado Ocidente – leia-se: civilizado. A clitorectomia, fisicamente, tem por finalidade a extirpação do clitóris e dos lábios pubianos. Logo após, a criança é costurada sendo deixado apenas um pequeno espaço para que a mesma possa urinar. “Espiritualmente” falando, esse é um procedimento que visa tornar a mulher “pura”, como deve ser toda serva de Deus, no caso do Islamismo, toda serva de Alá. Isso, obviamente, sujeita a mulher a um legítimo estupro iminente e consentido. Talvez você que me lê deva pensar que eu esteja relatando algo que não existe e que se algum dia existiu, há muito foi extinto. Porém, para minha tristeza e profunda indignação, estudos revelam que todos os dias seis mil meninas em todo o mundo são sujeitadas a essa verdadeira barbárie. Nós, mulheres, sempre sofremos com a opressão e a segregação, mesmo silenciosa, de alguns homens e de alguns sistemas que nos julgam incapazes de nos desenvolvermos individualmente alcançando o sucesso, a independência e a realização pessoal-profissional. Até hoje, mesmo em países tidos como progressistas e desenvolvidos (financeiro e intelectualmente) mulheres que ocupam cargos e executam funções similares a de outros homens recebem salários inferiores; bem como, quando optam pelo direito de não vivenciar a maternidade ou constituir família são estigmatizadas e condenadas como pessoas sem princípios e sem coração. Muitas mulheres acabam tomando por certo o estigma de que ela é submissa, criando para si limitações das quais não possui e construindo grades invisíveis, porém, aparentemente intransponíveis. Sou completamente a favor da liberdade de expressão e de escolha de cada um, mas acredito que quando uma pessoa nunca teve a oportunidade sequer de decidir, simplesmente porque desconhece a natureza da palavra liberdade, é hora de intervir, catequizá-la e aí sim, oferecer a ela a possibilidade de escolher. Eu, particularmente, não consigo conceber uma sociedade, de fato, igualitária e defensora dos direitos universais em meio a tantos [pré]conceitos e má-vontade no que diz respeito ao outro – no caso, à outra. Fico me perguntando por quantas revoluções e por quantos séculos mais teremos que passar para que coisas assim deixem, enfim, de fazer parte de nossa história presente. A clitorectomia é só um sinal do quanto a ignorância e a hipocrisia nos torna a todos seres atrasados, tal qual, nossos antepassados primatas.

Carolina Braga
[ hoje ]

terça-feira, 1 de setembro de 2009

A Lógica do Caos


A cada dia que passa me convenço de que as coisas nem de longe são como sempre me disseram. Nem de longe e muito menos de perto. Não existe essa de certo e errado, como se tudo fosse algo projetado, pensado e não sentido, vivido e pulsado. Nem sempre choramos porque estamos tristes, nem sempre sorrimos porque estamos felizes, às vezes acontece o inverso e às vezes acontece o que nós mesmos não compreendemos. Nem sempre nossas perguntas possuem respostas, nem sempre as respostas implicam em soluções. E é completamente inútil tentar entender a lógica de tudo, pois o mundo é a própria dinâmica do caos, enquanto que nós estamos simplesmente no olho do furacão. É mais acertado deixar a ventania passar para ver depois no que vai dar. Só assim poderemos saber, enfim, o que fazer com essa força que não controlamos, mas que por isso mesmo devemos usar sempre ao nosso favor. Como o barco a vela, que até em dias de maior tempestade não desvia de seu trajeto, nem uma só légua, nem por um decreto.

Carolina Braga, 31 de ago. de 09.

Fora de Ritmo


Há momentos em que a dor já não dói. De tanto que já sangrou, de tanto que já sofreu. Momentos em que nos vemos anestesiados diante dela. Entregues a esse cruel destino. Instante em que nem sequer conseguimos acompanhar o ritmo daquilo que nos cerca. É como se vivêssemos em outra dimensão e nada pudesse nos alcançar. Às vezes, tudo parece sem sentido, é como se você tivesse certeza que não faz parte de tudo isso. Que por mais que pareça tanto, pra você é muito pouco pra justificar sua presença nessa ciranda sem nexo, em que ninguém te convidou em que você nenhum contrato assinou. Oh, meu Deus, me diga: onde está a graça desse baile de máscaras?

Carolina Braga, 29 de ago. de 09.